APÓS VETOS DE PADILHA
Prostitutas exigem que Ministério da Saúde tire campanha contra Aids do ar
Mulheres que participaram da elaboração da campanha original alegam que vetos promovidos pelo ministério tornaram a campanha 'higienizada e descontextualizada'
por Site Beijo da Rua publicado 11/06/2013 14:18, última modificação 11/06/2013 14:36
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São Paulo – Prostitutas que participaram da elaboração da campanha de prevenção de Aids lançada, vetada e depois modificada pelo governo federal enviam notificação extrajudicial ao Ministério da Saúde, hoje (11), revogando a autorização de uso de imagem e exigindo a imediata suspensão das peças em que aparecem.
Elas alegam “radical mudança” na campanha original, que deixou de privilegiar “o enfrentamento do estigma e preconceitos como estratégia de prevenção às DST e Aids” para ter foco apenas no incentivo ao uso da camisinha, tornando-se “higienizada e descontextualizada”.
“A proposta era reafirmar o entendimento, já consolidado técnica e politicamente, de que, para além das questões e informações biomédicas, o gozo de direitos básicos, autoestima e cidadania constitui condição imprescindível para a promoção da saúde, especialmente em grupos considerados sob maior vulnerabilidade social em razão do estigma, preconceito e discriminação social”, diz a notificação, elaborada pelo assessor jurídico da Rede Brasileira de Prostitutas, Roberto Chateaubriand Domingues.
O governo retirou do ar peças que tratam de felicidade (“sou feliz sendo prostituta”, por Nilce Machado), de cidadania (“o sonho maior é que a sociedade nos veja como cidadãs, com Nanci Feijó) e da luta contra a violência (“não aceitar as pessoas da forma que elas são é uma violência”, de Jesus), deixando apenas as que associam prevenção com camisinha.
Batalha
“Passei uma semana sem batalhar, para poder participar dessa oficina, pensando em construir algo novo que contribuísse para todas nós, e hoje me envergonho com o resultado”, desabafa Maria Luzanira da Silva, uma das signatárias da notificação.
Coordenadora geral da Associação de Prostitutas da Paraíba (Apros-PB), de João Pessoa, onde foi realizado em março o evento de criação da campanha, Luzarina faz questão de afirmar: “Sou uma puta cidadã e tenho o direito de expressar meus sentimentos. Sou feliz sendo prostituta”.
Aparecida Viera, da Associação de Prostitutas de Minas Gerais (Aprosmig), conta que autorizou a campanha “com as colegas de trabalho que estavam na oficina” e não o uso de imagens escolhidas “em leilão”. E decreta: “Quero a retirada da minha foto dessa campanha preconceituosa”.
Ativista da associação maranhense de prostitutas (Aprosma), Jesus considera que “as prostitutas não têm motivo para ter vergonha de nada, pois estamos mostrando a nossa cara”, e que os representantes do governo é que deveriam “ter vergonha” com a mudança da campanha. “Já sabemos comer com nossas mãos. Este povo quer brincar conosco, vamos dar para eles nossas respostas”, disse.
Outra participante da oficina, Nanci Feijó acha que, além de “tirar do ar esta campanha que o ministério relançou”, as prostitutas não deveriam sequer voltar a atuar em parceira com o governo. Ainda “muito revoltada”, a militante da Associação Pernambucana de Profissionais do Sexo (APPS) já fez circular nas redes sociais uma peça em que aparece ao lado da frase que se tornou sucesso nacional: “Sou feliz sendo prostituta”.
A autora da frase também faz questão de enviar a notificação exigindo que não seja utilizada qualquer imagem que tenha sido produzida durante a oficina. Nilce Machado, presidente do Núcleo de Estudos da Prostituição, o NEP de Porto Alegre, lembra que os vídeos da campanha (também censurados) foram exibidos em praça pública, ao final da oficina em João Pessoa, e “muito bem aceitos” por integrantes do governo municipal. “Como posso fazer campanha de prevenção sem falar na profissão?”, questiona.
Sobre a frase que escancarou a traição do governo a princípios da saúde pública, em troca de uma infeliz ambição eleitoreira, ela confirma quantas vezes for necessário: “Sou, sim, uma prostituta feliz e nem esse governo vai tirar a minha felicidade”.
Gabriela Leite, fundadora do movimento de prostitutas no Brasil nos anos 1980, está “orgulhosa das colegas que se indignaram com essa violenta intervenção do governo na campanha”. Para ela, essas reações “são também fruto de 30 anos de militância”.
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